Foi impressão minha ou o Festival da Canção foi deprimente?
Já não chorava assim desde que trinquei a língua na quarta.
A minha própria língua.
Há um processo qualquer de paralesia cerebral que faz com que um ser humano sóbrio morda a sua própria língua.
Na pior das hipóteses, a bochecha.
Aí sim.
Quando se arranca uma fatia perfeita da bochecha como fazem aqueles indivíduos brasileiros naquele espeto de carne da pita shoarma, vale a pena chorar.
Ainda assim, houve umas quantas músicas que me doeram mais.
Só aqui entre nós, fiz o mesmo truque que fazem alguns soldados de guerra:
Provoquei em mim próprio o dobro da dor propositadamente, para anular a anterior.
Arranquei dois bifes das bochechas para suprimir o sofrimento das músicas oito e nove.
Não valeu de nada.
Ainda para mais porque era a Isabel Angelino a apresentar.
Fascinam-me apresentadoras que estão sempre muito, mas muito contentes.
Dá-me medo.
É aquele sorriso que só vive nos músculos da cara.
Dizem o número de telefone para onde se pode votar a escolher a música vencedora com a alegria de quem olha para o filho recém-nascido pela primeira vez.
Ou com a alegria de quem matou o avô com uma almofada de penas.
Ela tem um sorriso que está ali no limbo entre os dois.
Quando uma pessoa ri assim tanto há alguma coisa que não está bem.
Ou está bem demais.
O meu irmão Nikita não voltará a Kharkiv.
Há 4 semanas