Há qualquer coisa de estranho no país.
Qualquer coisa que bate no rítmo errado.
Qualquer coisa que falha.
Eu sabia que havia qualquer coisa que falhava, que morria, mas faltava-me os olhos para confirmar.
Agora já sei:
Partiu.
Faleceu há cerca de um mês o tão divertido boneco do Multibanco.
E recrutaram este que é absolutamente ridículo.
Fizeram com o outro o mesmo que fizeram com a Picolé na Praça da Alegria : um empurrão para o fim.
Um encosto para o nada.
Havia qualquer coisa de triunfalmente alegre quando o outro boneco nos pedia para marcarmos o código pessoal.
E nós confiávamos nele o que não confiamos em muitos amigos.
Os quatro digitos que ele recebia e selava.
Fica ainda a maneira como nos entreolhava para introduzirmos o cartão.
Tudo isso era de uma finura misturada com saber viver que deixava poucas dúvidas: ele estava ali, naquela caixinha, mais do que feliz por se lambusar com os nossos cartões.
Dia após dia.
Nós brutos, apressados, irritados, indiferentes.
E ele lá, sereno, a pedir-nos o que já sabiamos.
E tudo com um par de luvas brancas, para que não haja cá confusões.
Como manda a lei.
Como manda a sapatilha.
Como manda tudo.
Tudo feito com a força de uma vida.
Ficarei para sempre com a imagem dele desolado, com o coração feito em restos de nada, com os braços dele feitos braços do céu ,a suplicar: "dirija-se ao multibanco mais próximo".
Dirija-se ao multibanco mais próximo.
Para se dizer isto é preciso carregar uma honestidade esmagadora.
Ali nasceu, ali viveu, e ali acabou por morrer.
Mas cedo demais, parece-me.
Cedo demais.
Deu lugar a um mais novo, é certo, mas infinitamente menos discreto a pedir o código pessoal e patético na parte do "retire o seu dinheiro".
É o progresso, dizem uns.
É o fim, digo eu.
Descansa em paz
P.s.- Reparem uma útlima vez na pintarola (não há que ter medo da palavra pintarola) que este jovem tinha ao pedir para marcarmos o código pessoal com a descontracção de uma perna cruzada.
Classe.
O meu irmão Nikita não voltará a Kharkiv.
Há 4 semanas