segunda-feira, 6 de outubro de 2008

r.i.p.

Há qualquer coisa de estranho no país.
Qualquer coisa que bate no rítmo errado.
Qualquer coisa que falha.
Eu sabia que havia qualquer coisa que falhava, que morria, mas faltava-me os olhos para confirmar.
Agora já sei:



Partiu.
Faleceu há cerca de um mês o tão divertido boneco do Multibanco.
E recrutaram este que é absolutamente ridículo.
Fizeram com o outro o mesmo que fizeram com a Picolé na Praça da Alegria : um empurrão para o fim.
Um encosto para o nada.
Havia qualquer coisa de triunfalmente alegre quando o outro boneco nos pedia para marcarmos o código pessoal.
E nós confiávamos nele o que não confiamos em muitos amigos.
Os quatro digitos que ele recebia e selava.
Fica ainda a maneira como nos entreolhava para introduzirmos o cartão.
Tudo isso era de uma finura misturada com saber viver que deixava poucas dúvidas: ele estava ali, naquela caixinha, mais do que feliz por se lambusar com os nossos cartões.
Dia após dia.
Nós brutos, apressados, irritados, indiferentes.
E ele lá, sereno, a pedir-nos o que já sabiamos.
E tudo com um par de luvas brancas, para que não haja cá confusões.
Como manda a lei.
Como manda a sapatilha.
Como manda tudo.
Tudo feito com a força de uma vida.
Ficarei para sempre com a imagem dele desolado, com o coração feito em restos de nada, com os braços dele feitos braços do céu ,a suplicar: "dirija-se ao multibanco mais próximo".
Dirija-se ao multibanco mais próximo.
Para se dizer isto é preciso carregar uma honestidade esmagadora.

Ali nasceu, ali viveu, e ali acabou por morrer.
Mas cedo demais, parece-me.
Cedo demais.
Deu lugar a um mais novo, é certo, mas infinitamente menos discreto a pedir o código pessoal e patético na parte do "retire o seu dinheiro".
É o progresso, dizem uns.
É o fim, digo eu.

Descansa em paz



P.s.- Reparem uma útlima vez na pintarola (não há que ter medo da palavra pintarola) que este jovem tinha ao pedir para marcarmos o código pessoal com a descontracção de uma perna cruzada.
Classe.