Hoje, 11h15, dentista.
Consultório bonito.
Motivo: Parti parte significativa de um dente, e antes que nosso senhor o levasse por completo, fui pedir ajuda aos justiceiros da boquinha.
Cadeira muito bonita, broca do "mai" lindo que há, e um instrumento do qual sou fã e não poderia deixar passar em branco: o aspirador de saliva.
Aparelhómetro de altíssimo nível, que permite compor melodias do mais belo que já foi ouvido quando se passeia por lá com a língua.
Equipam-me de babete e cabecinha encostada num almofada de medo.
Começa.
Abro a boca para além de muito. Se me pedissem para comer o mundo abriria pouco mais.
A primeira aproximação é feita com um espelhinho, meio apaneleirado, confesso. Uma espécie de retrovisor desse grande mundo que é o automóvel dentário.
Não estava nada de bom, e teria de aplicar um belo chumbinho, só para ver se eu me acalmava.
Começa, a sério.
Damos as boas-vindas a uma seringa, que vista assim, a medo, parece ter 3 andares.
Uma coisa enorme, de agulha em riste, que nos arromba as trancas da boca, entra porta a dentro da gengiva, e adormece-a.
E com ela, a calma.
O barulho de uma broca a trabalhar sobre o olhar atento do céu da boca ensurdece a parte fraca dos nervos.
Ensurdece-nos por dentro.
Atestaram-me o chão da língua com metal, barulhos e mãos que nos violam o sabor.
Cedida então a nossa boca, cumprimentamos as lâmpadas todas.
Vemos dois pares de olhos debruçados em "isto não está nada bom" e máscaras de demasiado à vontade.
Pensamos nas coisas todas que temos para fazer e que nunca vamos fazer.
Pensamos na nossa casa.
Pensamos em coisas para pensar.
Bochechamos restos mais que mortais num copo de água, e deixamos os músculos descansar.
Relembre-se aqui que bochechar água com meia boca adormecida é dos processos mais deprimentes a que se pode assistir. Fazemos tudo com um ar doutoral, mas os esguichos de água que escorrem queixo abaixo (também ele adormecido) dão-nos um toque de pateta alegre.
Anestesiado, mas alegre.
Fazemos promessas de terminar com as cáries do mundo inteiro. Que agora tudo vai ser diferente e esta dentição vai ser do mais bem cimentado que se viu por estas bandas.
Saímos. Pagamos meio PIB do Cazaquistão e saímos consultório fora.
Hoje como só com o lado esquerdo, e trinco a bochecha do lado direito que parece ter dois metros de largo.
Segunda feira volto lá. Parece que dava jeito ao Cazaquistão eu rebentar com outra cárie.
Ainda cá está alguém
Há 2 meses