sábado, 15 de julho de 2006

11h15 - Dentista

Hoje, 11h15, dentista.
Consultório bonito.
Motivo: Parti parte significativa de um dente, e antes que nosso senhor o levasse por completo, fui pedir ajuda aos justiceiros da boquinha.
Cadeira muito bonita, broca do "mai" lindo que há, e um instrumento do qual sou fã e não poderia deixar passar em branco: o aspirador de saliva.
Aparelhómetro de altíssimo nível, que permite compor melodias do mais belo que já foi ouvido quando se passeia por lá com a língua.
Equipam-me de babete e cabecinha encostada num almofada de medo.
Começa.
Abro a boca para além de muito. Se me pedissem para comer o mundo abriria pouco mais.
A primeira aproximação é feita com um espelhinho, meio apaneleirado, confesso. Uma espécie de retrovisor desse grande mundo que é o automóvel dentário.
Não estava nada de bom, e teria de aplicar um belo chumbinho, só para ver se eu me acalmava.
Começa, a sério.
Damos as boas-vindas a uma seringa, que vista assim, a medo, parece ter 3 andares.
Uma coisa enorme, de agulha em riste, que nos arromba as trancas da boca, entra porta a dentro da gengiva, e adormece-a.
E com ela, a calma.
O barulho de uma broca a trabalhar sobre o olhar atento do céu da boca ensurdece a parte fraca dos nervos.
Ensurdece-nos por dentro.
Atestaram-me o chão da língua com metal, barulhos e mãos que nos violam o sabor.
Cedida então a nossa boca, cumprimentamos as lâmpadas todas.
Vemos dois pares de olhos debruçados em "isto não está nada bom" e máscaras de demasiado à vontade.
Pensamos nas coisas todas que temos para fazer e que nunca vamos fazer.
Pensamos na nossa casa.
Pensamos em coisas para pensar.
Bochechamos restos mais que mortais num copo de água, e deixamos os músculos descansar.
Relembre-se aqui que bochechar água com meia boca adormecida é dos processos mais deprimentes a que se pode assistir. Fazemos tudo com um ar doutoral, mas os esguichos de água que escorrem queixo abaixo (também ele adormecido) dão-nos um toque de pateta alegre.
Anestesiado, mas alegre.
Fazemos promessas de terminar com as cáries do mundo inteiro. Que agora tudo vai ser diferente e esta dentição vai ser do mais bem cimentado que se viu por estas bandas.
Saímos. Pagamos meio PIB do Cazaquistão e saímos consultório fora.
Hoje como só com o lado esquerdo, e trinco a bochecha do lado direito que parece ter dois metros de largo.
Segunda feira volto lá. Parece que dava jeito ao Cazaquistão eu rebentar com outra cárie.